Na
Semana da Mulher, realizada anualmente na EREM - Trajano de Mendonça, nosso
grupo do PIBID-UFPE foi convidado para compor a programação do evento. Ao nos
reunirmos, optamos trabalhar com os(as) alunos(as) o tema “Empoderamento
Feminino Negro”. Com essa temática, tivemos como objetivo levar um dos
conceitos de empoderamento, discutir as correntes feministas, a partir de uma
perspectiva histórica, assim como o racismo, classe, gênero e apropriação
cultural.
Aplicamos
o plano de aula em duas turmas. Assim que chegamos na sala, pedimos para que
todos(as) fizessem um grande círculo. Após se acomodarem, solicitamos que eles
anotassem em um papel alguns adjetivos, palavras, sensações que eles(as) tinham
e que guardassem aquele papel para o final da aula.
Para
isso, dar continuidade a aula, utilizamos a música “Mulheres Negras” da rapper
feminista, Yzalú, que funcionou como motivação inicial da aula e também nos
serviu como plano de fundo para que os(as) alunos(as), através da letra da
canção, começassem a ser provocados com as diversas temáticas abordadas pela
cantora.
Alunos participando da atividade proposta pelos bolsistas.
Na
primeira aplicação do plano de aula, após os(as) alunos(as) receberem a canção
impressa, pedimos que todos(as) acompanhassem a música que ia tocar, em
leitura, e que eles(as) grifassem as partes que lhes chamaram mais atenção e
que também poderiam fazer anotações, indagações, contextualizações. Nessa
atividade, foram identificados por eles(as): diferença de classe, a temática da
escravidão, questionaram a publicidade em torno das mulheres negras, assim como
seus papéis nas novelas e também cargos importantes que elas estavam
invisibilizadas como médica, donas de uma empresa.
Ao
perguntarmos sobre o que eles(as) achavam que significava “empoderamento”, foi
possível perceber que eles, no primeiro momento, identificaram o empoderamento
da mulher como se esta estivesse acima do outro gênero, ou seja, acima do homem
ou também como alguém que estava “tomando poder” ou “detendo poder nas mãos”.
Entretanto, ao conceituarmos o termo como: “Empoderar-se é reconhecer-se
enquanto sujeito social, político, autor de sua própria história e capaz por
lutar por seus direitos, que não são só seus, mas também de um grupo”, eles
começaram a mencionar outras questões como a não submissão no relacionamento,
no momento em que um dos colegas de classe mencionou que não deixaria uma
namorada sair sozinha, e também com a estética negra, relacionando às mulheres
negras deixarem o cabelo natural (cacheado, crespo) como uma forma de se
empoderar.
Alunos foram convidados à autorreflexão sobre o papel da mulher negra no cotidiano.
Apresentamos
a temática do movimento de mulheres, a partir da menção da construção do
movimento feminista no século XX, que começou a surgir num contexto
essencialmente branco e de classe média. Contudo, foi-se compreendendo, com o
tempo, que as mulheres negras não lutam “apenas” contra o machismo e a
misoginia, mas também contra a distinção de classe e o racismo. Dentro de um
debate mais contemporâneo, utilizamos como exemplo a Marcha das Vadias, que é
um movimento muito criticado por mulheres negras. Tanto que, para essa
afirmação, recorremos a uma carta aberta escrita por uma mulher negra,
publicada no site “Black Women’s Blueprint”, que foi traduzida em português. Podemos
dar destaque a esse trecho, que foi o ponto principal tocado na sala de aula,
para apontarmos a crítica:
“Como
Mulheres Negras, não temos o privilégio ou o espaço de nos chamarmos de “Vadia”
sem validar a ideologia historicamente intrincada e recorrente de quem é a
Mulher Negra. Nós não temos o privilégio de brincar com representações
destrutivas que foram marcadas no nosso imaginário coletivo, nos nossos corpos
e nossas almas por gerações. Apesar de compreendermos o ímpeto válido por trás
do uso da palavra 'vadia’ como linguagem usada para enquadrar e representar um
movimento anti-estupro, estamos gravemente preocupadas. Para nós, a
trivialização do estupro e a ausência de justiça são cruelmente ligadas à
narrativas de vigilância sexual, acesso legal e disponibilidade da nossa
humanidade. É ligado a ideologia institucionalizada de nossos corpos como
objetos sexuais da propriedade de outra pessoa, espetáculos de sexualidade e
desejo sexual. É ligado às noções de nosso corpos, com roupas ou sem roupas, serem
impossíveis de serem estuprados, seja na plataforma de leilão (nota: local onde
se colocavam escravos à venda), nos campos ou na tela da televisão. A
percepção, e a larga aceitação de especulações sobre o que a Mulher Negra quer,
o que ela precisa e o que ela merece, há muito tempo ultrapassou as barreiras
de somente como ela se veste.
"Semana da mulher" se tornou tradição na EREM Trajano de Mendonça e alunos aderem maciçamente à causa.
Com
esse debate, também foi possível adentrar no tema sobre hiperssexualição do
corpo feminino negro e também de como as mulheres negras são retratadas na
mídia de maneira pejorativa. Os(as) alunos(as), como forma de trazer a exceção
para sala de aula, mencionaram o programa televisivo da Globo, “Mister Brau”, e
foi sentido, em algumas falas, que a própria mídia usava isso, assim como
colocar mulheres negras em comerciais de televisão ou fazer produtos para
cabelos crespos como uma maneira de faturar mais, como se essas mulheres
“estivessem na moda”. Já outros(as) alunos(as), colocaram que isso é uma forma
de se está dando mais oportunidades para as mulheres negras, diminuindo o fator
do racismo.
A
partir desse momento, começamos a discutir um pouco sobre “apropriação
cultural”. Utilizamos como exemplo a Loja Farm, que fez uma coleção de roupas
associadas ao mar, e colocou uma modelo branca para tirar uma foto com simbologia
referente à Iemanjá. Provocamo-los (as) para refletirem se fosse uma mulher
negra naquela foto: “o que associariam se fosse uma mulher negra com referência
à Iemanjá?”. Logo os (as) alunos (as) mencionaram que isso seria algo
depreciativo, pois associariam a “macumba”, apontando a questão da
“intolerância religiosa”.
Como
se foi dito, pedimos para que os (as) alunos (as) escrevessem num papel algumas
associações que lhes vinham na mente quando escutassem “mulheres negras”. O
objetivo era que no final da aula, eles escrevessem novamente o que eles
achavam que podiam associar a essas mulheres e também que escrevessem cartazes
com os assuntos abordados na sala de aula, ou seja, em torno da temática.
Percebemos
que a música “Mulheres Negras” tinha um potencial ainda maior do que pensávamos
para aula, no primeiro instante, e passamos a discutir, na segunda turma,
através da música. Os trechos iam sendo mencionados pelos (as) alunos (as) e, a
partir disso, começamos a discutir com ele sobre os temas que foram pensados
por nós previamente. Constatamos também que, dessa forma, o debate ficou mais
fluido e os(as) alunos(as) participaram de maneira mais efetiva e também que
conseguimos nos ater mais ao tempo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário