sábado, 10 de dezembro de 2016

História local

Trabalho completo apresentado pelo aluno PIBID Manoel Caetano do Nascimento Júnior no VIII Encontro Estadual de História da ANPUH-BA, ocorrido em Feira de Santana (UEFS) no período de 01 a 14 de novembro de 2016.



HISTÓRIA LOCAL E O ENSINO DE HISTÓRIA: DAS REFLEXÕES CONCEITUAIS ÀS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
Manoel Caetano do Nascimento Júnior[1]
manoel_nascimento01@hotmail.com
Profª. Drª. Isabel Cristina Martins Guillen (orientadora)[2]

Introdução
As problematizações aqui explanadas estão embasadas em alguns momentos pedagógicos – recentes – com o uso da metodologia da história local aplicadas com intuitos educacionais, onde estiveram envolvidos alunos da graduação, professores universitários, professores e discentes da rede pública do ensino fundamental e médio da região metropolitana do Recife.  As ideias a seguir não pretendem servir de padrão, mas a intenção é poder ajudar no estimulo, para que ações educativas nesse viés venham a ser elaboradas. O objetivo maior é de que os problemas enfrentados no cotidiano escolar possam, dessa maneira, ser atenuados ou, até mesmo, esclarecidos.
As experiências vivenciadas estão inseridas nas atividades do PIBID de História da UFPE, campus Recife, que é composto por 05 equipes, de 05 alunos da graduação, divididos em 05 escolas públicas da cidade. Se objetiva, entre outros procederes, pela inserção dos licenciandos no cotidiano de escolas da rede pública de educação, oportunizando a criação e participação em experiências metodológicas, tecnológicas e práticas docentes de caráter inovador e interdisciplinar que pretendam superar problemas identificados no processo de ensino-aprendizagem, como por exemplo, a suplantação de barreiras que opõem a teoria e a prática na docência (PIMENTA, S.G E LIMA, 2008), contribuindo, dessa forma, na formação dos docentes e elevando o nível das ações acadêmicas nos cursos de licenciatura.
Em 2015, a professora Drª. Isabel Cristina Martins Guillen juntamente com a professora Drª. Adriana Maria Paulo da Silva, coordenadoras do PIBID de História da UFPE, desenvolveram uma proposta sobre a história dos bairros nos quais as escolas públicas que receberam os alunos da licenciatura estavam situadas. Os grupos de graduandos do PIBID tinham o propósito de responder a problemática central que envolvia os bairros “as transformações urbanas na cidade e como impactavam na vida das pessoas”. É necessário ressaltar que no Recife vivíamos essa grande discussão devido a repercussão do movimento Ocupe Estelita.[3] Numa das escolas da ação, como por exemplo a situada no bairro da Torre, os estudantes da graduação conjuntamente com demais membros da comunidade escolar promoveram o ‘Ocupe a Torre’ levando alunos da escola e moradores do lugar a interagir e discutir as transformações na paisagem e a especulação imobiliária que cresceu na área recentemente (GUILLEN, 2016, no prelo).
Estimuladas por essas questões as professoras propuseram atividades de pesquisa-ação para as escolas envolvidas no projeto com o intuito de que os alunos do ensino básico percebessem e fossem conduzidos a refletir sobre as transformações que ocorrem nos bairros em que moram. Neste sentido o intuito era sair do tradicional método que as escolas adotam e envolver ensino e pesquisa na escola básica, pensando justamente em uma ação educacional modificadora (GUILLEN, 2016, no prelo).
Foram selecionados para esse projeto lugares que propiciassem reflexões sobre a história de Recife e de seus bairros, de maneira a estabelecer relações com as questões que a cotidianidade levantava e, dessa maneira, articular um trabalho de campo – na medida em que alunos da graduação e alunos do ensino básico foram instigados a frequentar e pesquisar aspectos de seus bairros – e posteriormente, com esse levantamento de pesquisa, vislumbrar a possibilidade de ressignifação de alguns conteúdos tradicionais da cultura escolar.
Neste bojo é evidente a necessidade de um estudo mais aprofundado do que seja a história local e como ela se situa no campo do conhecimento histórico. Logo depois uma explanação das possibilidades e desafios do trabalho com a história local no ensino de história e por fim os resultados advindos de tais intervenções.
Estudar a história local – no âmbito do PIBID – consistiu em um exercício de tentar entender e pôr à mesa os desafio, as incertezas e as contribuições decorrentes do uso da referida metodologia – tanto no ensino como na pesquisa. Ao se debruçar no tema, é perceptível não haver consenso dos limites e possibilidades deste recurso, mas quando pensamos no trabalho com o ensino de história, com a aplicação de um momento pedagógico que valoriza a história do homem e da mulher comum, inserindo alunos, professores e muitas vezes outros sujeitos às aulas de história, percebemos a necessidade de tentar, mesmo que de forma tímida, cascavilhar as discussões em torno da produção da história local, situá-la no tempo, repensá-la.
Pensar a história local parece nos conduzir a uma ideia “nova de batalha”[4] . De uma tentativa instigante de vislumbrar o movimento de certa história que perceba as várias dimensões existentes e para além de olhar os aspectos nacionais e internacionais, atentem para recolocar nas discussões e construções de hoje, as questões locais.
Aplicar a história local na contemporaneidade se assemelha a tarefa de compreender que a história está presente em diversos lugares, em todos os momentos. De que o local, está diretamente relacionado aos espaços e contextos para além de um ambiente definido e onde as circunstâncias sociopolíticas, econômicas e culturais vivenciadas no cotidiano de cada indivíduo interfere e são modificadas por esses mesmo sujeitos.  Santos (2002) vai dizer que “Operar com essa abordagem da história, portanto, importa compreender que as realidades históricas de determinada localidade e de seus habitantes no tempo não se dão isoladamente do mundo, e sim como partes desiguais mas vivas, ativas e inseparáveis dele”.

Um lugar à história local
Atualmente é perceptível que há um alargamento de interesse dos Historiadores pela questão local, especialmente nessas duas primeiras décadas do século XXI, pois ampliaram-se bastante apresentações de trabalhos acadêmicos e outras abordagens entorno dessa temática. Mas não foi de forma súbita que ela emergiu. Desde a década de1970 ela vem ganhando espaço e ressignificações. Como bem aponta Proença (1990, p. 139), ainda na década de 1990: “A História Local tem conhecido, nos últimos anos, um progressivo, desenvolvimento devido ao interesse da investigação histórica atual, pelo estudo das comunidades locais”.
            Mas esse ganho de papeis na construção da História, por parte da história local, está intimamente ligado com a crescente desconfiança nos modelos que pretendem as macroabordagens. Uma característica de nosso tempo, como lembra Terry Eagleton (2016), é ser de incertezas e instabilidades, estas são tantas, que fica dificultoso estar distante da perplexidade e acomodar-se. Nesse sentido, entenda como um movimento contemporâneo de rejeição as abordagens totalizantes, valores universais ou grandes narrativas históricas. Para este autor o nosso tempo é duvidoso a respeito de questões como verdade, unidade, progresso e opõe-se ferozmente a todo tipo de elitismo na produção do conhecimento. A tendência desse tratamento é a “descontinuidade e a heterogeneidade” (EAGLETON, 2016, p. 27).
No Brasil, por exemplo, houve durante o século o século XIX e até meados do século XX, com a produção dos memorialistas, organizada em estudos das histórias locais, uma escrita que procurou estabelecer uma identidade nacional brasileira que explorasse mecanismos de homogeneização, na qual aspectos políticos e econômicos eram a célula central.
Nesta linha de raciocínio, ser mineiro, gaúcho, pernambucano era o que determinava a identidade brasileira. Não se tinha o intuito de estudar as diferenças entre os espaços definidos, muito menos, de analisar as subjetividades diferenciadas de cada grupo, as formas de organização em “sindicatos e associações”, ou como lidavam com as questões do cotidiano (MELO, 2015, p. 30).
Essa perspectiva se manteve durante os períodos de governos ditatoriais onde se procurava a homogeneização dos diversos grupos que compunham e compõem o amálgama da sociedade brasileira. O intuito era de legar aos indivíduos os feitos dos grandes heróis e de colocar no hall da fama da História, figuras restritas, como representantes do que seria a nacionalidade. Este viés sustentaria o Estado-nação (BITTENCOURT, 2008)
Ainda no recorte brasileiro, a partir da década de 1980, há um esforço por quebrar essa lógica totalizante e homogeneizante – muito disseminada, por exemplo, no ensino – com base na produção que se constituía na Europa, como por exemplo, a nova História Francesa com seu enfoque no cotidiano e na memória, a história social inglesa e a Micro-história italiana ao analisar as escalas de observação. Toda essa exteriorização das novas perspectivas de trabalho do Historiador, além de abrir caminho ao estudo da história local, mostrou que antigas formas de trato da história, como foi o caso do marxismo, já não estavam conseguindo dar conta das necessidades explicativas à nova forma de organização social.
A história local, durante o processo de constituição e solidificação como campo de estudos, foi encarada diversas vezes, como uma abordagem teórico-metodológica que só contava a história de um determinado lugar, fechado em seus limites político-administrativos. Dessa forma, descrevendo os feitos dos líderes locais, selecionando os ‘bons’ homens do local para receber as honras de escrever o nome na História. Com isto ia se construindo narrativas empobrecedoras, pois se limitava a situações localistas[5] e elitistas. 
É importante levantar a discussão de que, a história local se permite hoje tais aproximações com outros modos de construção histórica, por ter reconfigurado suas bases, por ter saído de uma interpretação Local tradicional e, pelo surgimento de uma nova história local. Esta, só foi possível pelas ressignificações de região, território e lugar por parte da Geografia que, paulatinamente, passou de uma postura de região tida como dado natural, para considerar as ações humanas e suas contradições sociais na formação, e reconstituição do espaço. Ou seja, na nova configuração do que se constitui como local, é de suma importância a familiaridade do sujeito com um determinado espaço. Desse modo, não há a necessidade de precisar um espaço de forma a defini-lo – uma perspectiva limitada de espaço –, mas vivencia-lo, pois à medida em que nos apropriamos do local “o dotamos de valor” (FERREIRA, 2000, p. 65).
Numa perspectiva de história local tradicional a área geográfica natural é preponderante, se estudam flora e fauna e se elaboram relatos dos grandes fatos ocorridos em determinado espaço. Dessa maneira a produção da história local é ufanista; exaltadora dos grandes feitos da localidade. É uma época onde imperam as corografias que são, justamente, essas explanações laudatória e apoteótica de elites com feitos gloriosos (CORRÊA, 2012, p. 15).
Já a nova história local tem o intuito de estudar realidades locais com o uso de uma metodologia variada e sem excluir as ligações possíveis. O espaço na nova analise não se restringe ao político-administrativo, mas foca o estudo do local. Este, por sua vez, pode ser entendido como um lugarejo, aldeia, vila, bairro e cidade. Se valoriza nessa perspectiva uma visão do homem como agente social, econômico e político da História, não uma parcela da população, mas a totalidade das pessoas.
Um livro que nos possibilita entender a história local nova, pode ser o do professor da Universidade Federal de Pernambuco, Antônio Torres Montenegro, intitulado “história oral e memória: a cultura popular revisitada”. Neste livro o professor procura estudar diversos aspectos da cultura popular através da metodologia da História Oral – outro recurso para a construção da história local. Por meio desta abordagem ele nos apresenta as batalhas, as disputas e os medos imbuídos no pensamento popular. Consegue os dados através de entrevistas de “história de vida” e as relaciona com outros documentos, de caráter oficial, tendo o objetivo de “mergulhar nas histórias construídas em torno de acontecimentos que têm como palco Pernambuco/Recife, primordialmente, mas que, inexoravelmente e das formas mais diversas, estão relacionados, associados ao que se passa no Brasil e no resto do mundo” (MONTENEGRO, 2013, p.23). Dessa forma, o autor está atento ao jogo com as escalas, do local ao nacional e Internacional, mas não se restringe a isso. A História produzida, nos coloca diante de uma construção a contrapelo, pois o que antes se produzia sem a devida contribuição popular, no livro, essa contribuição dá o tom de uma História que trabalha as pessoas que tiveram suas vozes silenciadas pela concepção de produção do conhecimento histórico.
O tempo, um aspecto muito importante no livro, não é tratado como fez por muito tempo a história positivista com as sucessões políticas. Ele é encarado como o tempo do vivido e, nesta ideia, o homem – comum – é tido como agente transformador, na medida em que suas histórias se entrelaçam na teia que dá sentido às várias abstrações da História (MONTENEGRO, 2013).
O capítulo três, da referida obra, nos apresenta de forma mais precisa a abordagem da história local. Neste capítulo, intitulado: “Batalhas em Casa Amarela”, Montenegro, primeiramente, circunscreve e nos explica o espaço de análise, “O bairro de Casa Amarela, situado a seis quilômetros a noroeste do centro do Recife” (MONTENEGRO, 2013, p.52). Logo em seguida, vai nos conduzindo numa narrativa que mais parece uma batalha, pois os seguimentos populares disputam ferozmente o direito à terra, a moradia em Casa Amarela, enquanto que, por outro lado, os detentores do poder e as imobiliárias procuram, de maneira impiedosa, expulsar os moradores do bairro. Vale ressaltar que ler este trabalho permite perceber como acontece a construção da história local, e como esses documentos vão se constituindo em uma narrativa reveladora. Ao final da trama, graças ao movimento de combate às empreiteiras sob o nome “Terras de Ninguém” e pela formação de uma história popular, a comunidade consegue o direito as terras de Casa Amarela (MONTENEGRO, 2013).
Ao explanar como foi a composição do estudo realizado pelo professor Antônio Torres Montenegro, se teve o intuito de mostrar que nesta perspectiva, não se propõe uma história local aos moldes da historiografia tradicional e eurocêntrica, que se apresenta de forma linear ou que defenda a ideia de evolução na História. Ao contrário, no texto vemos a possibilidade de uma prática relacional entre contextos diferentes, a diversidade de ideias que circulava na localidade, e os diversos sujeitos que surgem, como protagonistas.
Assim, a história local tem se transformado, ficado heterogênea, abarcado o cotidiano e visitado memórias, privilegiando novos objetos e sujeitos, envolvendo variados espaços e territórios, com temporalidades as mais diversas, tendo o objetivo de poder elaborar um saber de relevância para os anseios contemporâneos. Como no dizer de Samuel (1990):
A história local requer um tipo de conhecimento diferente daquele produzido no alto nível de conhecimento nacional e dá ao pesquisador uma ideia muito mais imediata do passado. Ele a encontra dobrando a esquina e descendo a rua. Ele pode ouvir seus ecos no mercado, ler seu grafite nas paredes, seguir suas pegadas nos campos (SAMUEL, 1990, p. 220).

Foi com essa perspectiva de “nova” história local que procuramos conduzir os alunos a um trabalho educativo a partir do PIBID de História da UFPE. O importante consiste em puder ajudar o aluno a sentir a história no limite do que ela tem de concretude.

História local e ensino de história
É importante ressaltar que durante muito tempo o ensino de história não deu relevo as vivências dos estudantes e, muito menos, promoveu a valorização de outros sujeitos nas construções das histórias e isso, certamente, configurou um dos reforços – que permeiam a História do ensino de história – de que a disciplina é algo demasiadamente abstrato e, porque não, sem valor para a vida prática dos educandos. Uma narrativa linear de fatos seletos, marcada por personagens (heróis) e acontecimentos simbólicos, com causa e consequência e sem relações de utilidade na vida cotidiana dos alunos, foi o que predominou nas aulas de História, como ratifica Laville (1999).
A história local tem se mostrado necessária por oferecer esse contraponto, por viabilizar o entendimento do entorno do discente e por articular o passado e o presente nos vários espaços onde esse indivíduo frequenta, como por exemplo, escola, casa, cidade, trabalho e etc., e por situá-lo nas problemáticas do momento.
Concatenando com os propósitos da história local na contemporaneidade, observa-se que na proximidade, na vivência cotidiana e nos espaços onde o sujeito tem, no mínimo, uma leve identificação com o lugar, se torna mais aprazível fazer relações, ou seja, partindo de um aporte entre o que se vive, instiga-se o intervir e, assim, a ações de maneira mais espontâneas que vão sendo amadurecidas ao longo do tempo – pensamento crítico.
No ensino de história, como nos lembra Schmidt (2007, p. 189), a história local foi tomada “como um dos eixos temáticos dos conteúdos de todas as séries iniciais da escola fundamental e como perspectiva metodológica em todas as séries da escola básica”. Ou seja, há um certo consenso em torno da importância dessa metodologia aplicada ao ensino. Uma das principais justificativas para isto, é por ela – a história local e outras metodologias – instigar o olhar indagador e assim fazer os alunos questionadores do mundo do qual fazem parte.
Mas não são apenas essas as contribuições da história local ao ensino de história. Trabalhos com abordagens e fontes diversas (como o recurso ao relato oral, ou a documentos como jornais e fotografias) e de forma investigativa, tem feito alunos se interessarem por discussões acerca do patrimônio de sua localidade, levantamento de dados e construções das histórias locais, além de despertarem o olhar para a compreensão de ser, o lugar onde vivem, diretamente articulado com outros espaços. Um componente proveitoso deste estudo é, além dos já citados, a possibilidade de reconfigurar os conteúdos tradicionais, pois o objetivo da história local não é elimina-los – como alguns estudos alertam –, mas significa-los, aborda-los de uma forma diferente.
Ressaltar esses aspectos é crucial, pois a história local é constituída devido a interligações com outros métodos, como por exemplo, a história oral e, por si só, não constrói a História. Como salienta Samuel (1990, p. 237-239): “A História Local não se escreve por si mesma, mas como qualquer outro tipo de projeto histórico, depende da natureza da evidência e do modo como é lida”. Nos projetos pedagógicos isto deve ficar bem claro, pois uma história local, exclusivamente circunscrita a um espaço geográfico específico, fechada em sua abordagem, pode recair no já discutido localismo – que fragmenta a compreensão dos processos históricos mais amplos.
O saber escolar, com base na história local, deve permitir ao estudante as conexões entre o local, regional, nacional e mundial através do tempo. Entender os processos como dimensão da experiência humana fazendo surgir problematizações a respeito do espaço, do tempo e da sociedade e, desse modo, possibilita repensar a História em sala de aula, suprindo algumas barreiras de compreensão por parte do alunado (RÜSEN, 2001).
Schmidt (2005) ao pensar a necessidade da tomada de consciência histórica, por parte dos alunos, para que esses possam problematizar suas próprias condições no mundo, vai nos mostrar, – refletindo a partir de Rüsen que:
[...] a consciência histórica relaciona “ser” (identidade) e “dever” (ação) em uma narrativa significativa que toma os acontecimentos do passado com o objetivo de dar identidade aos sujeitos a partir de suas experiências individuais e coletivas e de tornar inteligível o seu presente, conferindo expectativa futura a essa atividade atual (SCHMIDT, 2005, p. 301).  
                                        
                Ou seja, a história local é apontada como uma forma de fazer o ensino de história se tornar algo mais inteligível ao estudante, facilitando a intervenção do sujeito nos espaços locais, amadurecendo suas perspectivas de reflexão sobre os espaços mais amplos. Assim, é necessário que a escola perceba os conhecimentos levados pelos jovens estudantes que estão imersos em uma cultura do consumo. E é imprescindível a percepção dos alunos para a pujança da história local, como também do reconhecimento de diversas identidades culturais existentes na localidade e, uma vez os discentes aproximados dos aspectos da localidade podem criar empatia e respeito por esse espaço (GUILLEN, 2016, no prelo).

História local e aprendizagens – à guisa de conclusão

            Em meio a tanta turbulência que perpassa o ensino, em um momento nada tranquilo da sociedade brasileira, trabalhar a história local parece um desafio pertinente e, dependendo da perspectiva colocada sobre essa metodologia, as possibilidades ao trabalho do professor se ramificam. As discussões e os interesses entorno do ensino de história se revelam nos currículos, a exemplo disso, são os desencontros sobre a Base Nacional Curricular Comum - BNCC. É importante ressaltar nesse contexto, as possibilidades que possam ser implementadas a partir de questões que se provem significativas, para não voltarmos a cometer as gafes de um ensino descontextualizado.
Bom... O essencial desse trabalho foi ver que ao ser desenhado, ele foi pensado para atender as pessoas da localidade em que o PIBID estava inserido. Eventos como o ‘Ocupe a Torre’ (citado na introdução), sites onde se disponibilizou a produção e o levantamento de material sobre a história do bairro de Jardim São Paulo (bairro também envolvido no projeto)[6], acervo de história oral sobre os bairros do Recife[7] e outras ações, fizeram com que o cenário de pouco conhecimento do local onde vivem os alunos fosse modificado e as concepções que tinham passassem a ser questionadas. Uma aluna por exemplo nos disse:
Sabia, mas muito por cima... por que a gente sempre acha que a História é algo muito distante. Ou em relação a tempo, ou em relação a espaço mesmo. Então o PIBID ta mostrando que não. A História ta em todos os cantos e muito mais perto do que a gente acha. (Kelly Santos, aluna do 1° ano do Ensino Médio da Escola Estadual de Paulista).
A partir do levantamento documental feito em cada bairro onde o PIBID de História atuou foi ainda possível aplicação de aulas sobre temas presentes nos livros didáticos, a partir, é claro, de outro viés que não os factuais e distantes das vivências dos alunos. Os planos de aula, por sua vez, possibilitaram no fazer docente uma preocupação e engajamento no modo da condução dos conteúdos.
Referências bibliográficas
BITTENCOURT, Circe. Capitalismo e cidadania nas atuais propostas curriculares de História. In: BITTENCOURT, Circe. O saber histórico na sala de aula. 11. ed. São Paulo: Contexto, 2008. Cap. 1. p. 11-27.
CORRÊA, Anderson Romário Pereira. História Local e Micro-História: encontros e desencontros. Revista do Instituto Histórico e Geográfico, Rio Grande do Sul, n. 146, p.11-27, 2012. Semestral.
EAGLETON, Terry. Depois da Teoria: Um olhar sobre os Estudos Culturais e o pós-modernismo. 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016. 301 p.       
FERREIRA, Luiz Felipe. Acepções recentes do conceito de lugar e sua importância para o mundo contemporâneo. Revista Território, Rio de Janeiro, v. 1, n. 9, p.65-83, jul. 2000. Semestral.
GUILLEN, Isabel Cristina Martins. História oral e ensino de história: experiências e debates. XIII Encontro Nacional de História Oral. Rio Grande do Sul, 2016. No prelo.
LAVILLE, Christian. Guerra das narrativas: debates e ilusões em torno do ensino de História. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 19, n. 38, p.125-138. 1999.
MELO, Vilma Lurdes Barbosa e. História Local: Contribuições para Pensar, Fazer e Ensinar. 1. Ed. João Pessoa: Editora da UFPB, 2015 254 p.
MONTENEGRO, Antonio Torres. História oral e memória: a cultura popular revisitada. 6. ed. São Paulo: Contexto, 2013. 153 p.
PIMENTA, S.G; LIMA, Maria Socorro Lucena. “Estágio: diferentes concepções”. In: Estágio e Docência. 5ª ed. São Paulo: Cortez,2010.p.33-57.
PROENÇA, Maria Cândida. Ensinar/Aprender História: questões de didática aplicada. Coimbra: Livros Horizonte. 1990.
RÜSEN, J. Razão Histórica: Teoria da História; Fundamentos da ciência histórica. Brasília, DF: UNB, 2001.
SAMUEL, Raphael. História Local e História Oral. Revista Brasileira de História. Pp. 219-242. V. 9, n. º 19, 1990.
SANTOS, J. J. M. dos. História do lugar: um método de ensino e pesquisa para as escolas de nível médio e fundamental. História, Ciências, Saúde.  Manguinhos, Rio de Janeiro, vol. 9, n. 01, 2002, p. 105-124.
SCHMIDT, M. A. M.S; GARCIA, Tânia Maria F. Braga. A formação da consciência histórica de alunos e professores e o cotidiano em aulas de História. Cedes, Campinas, v. 25, n. 67, p.297-308, out. 2005.
SCHMIDT, M. A.M.S. “O ensino de história local e os desafios da formação da consciência histórica”. In: MONTEIRO, A.M/ GASPARELLO, A.M/ MAGALHAES, M. S. (Org.). Ensino de História: sujeitos, saberes e práticas. 1ªed.Rio de Janeiro: Mauad X; FAPERJ, 2007, v.1, p.187-198.



[1] Graduado em História pela Universidade Federal de Pernambuco.
[2] Professora do Departamento de História da UFPE, coordenadora local do Mestrado Profissional em Ensino de História (PROFHISTÓRIA) e do PIBID.
[3] O Ocupe Estelita é um movimento social que visa impedir a demolição dos armazéns e parque ferroviário das Cinco Pontas, para a construção de grandes edifícios (torres) na região do Cais Estelita, Recife. É um movimento que discute não apenas o patrimônio cultural da cidade, mas as formas de se viver na cidade. Ver: https://direitosurbanos.wordpress.com/ocupeestelita-0/ocupeestelita/. Acesso em 25.10.2016.
[4] A primeira ideia de batalha entorno da construção da História surgiu com Lucien Frebvre no livro “Combates pela História” onde advoga uma nova forma, mais ampla, mais plural à época visando a construção de uma outra produção da História.
[5] O localismo manifesta-se como uma visão limitada do local, várias vezes de caráter bairrista, que só leva em consideração o local em si. Tem, não raro, um conteúdo discriminatório. Chega a negar outros espaços geográficos e fragmentar o local como se fosse um elo perdido no espaço sem conexões com outras situações.
[6] Visite a página do site através do endereço que segue http://historiajsprecife.wixsite.com/jsprecife/equipe-de-pesquisa. Nele você vai ver a pesquisa, o levantamento documental e alguns artigos produzidos para apresentar dados parciais de nossas ações, além de alguns trabalhos desenvolvidos com os alunos da escola básica.
[7] Laboratório de História Oral e da Imagem da UFPE. Lá você pode consultar as entrevistas feitas com moradores dos bairros envolvidos no projeto PIBID de História. 

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